PORTUGUÊS: BREVE HISTÓRICO DE UMA DISCIPLINA ESCOLAR


O componente curricular Língua Portuguesa há muito tempo ocupa um espaço significativo na educação básica brasileira e, atualmente, existe um consenso geral de que esse espaço é fundamental, pois a interação linguística atravessa todas as outras disciplinas e práticas sociais, de modo que saber ler, escrever, interpretar textos e se expressar com precisão, clareza e adequação são habilidades essenciais à vida escolar e extraescolar. Mas você já se indagou sobre como a Língua Portuguesa se tornou uma disciplina? Eis o que abordaremos, de forma resumida, nas linhas a seguir.

No Brasil do período colonial, conviveram, grosso modo, três línguas: a língua portuguesa, a língua geral (mistura de línguas indígenas provenientes do tronco tupi) e o latim. Nas escolas, o sistema pedagógico jesuítico, então predominante, privilegiava o ensino do latim e usava a língua portuguesa apenas como instrumento de alfabetização na primeira fase da escolarização. Foi a partir da segunda metade do século XVIII, com as reformas implementadas por Marquês de Pombal, que o uso da língua portuguesa na sociedade, bem como seu ensino escolar, passou a ser obrigatório. Nesse período, até fins do século XIX, os estudos da língua portuguesa eram divididos entre Gramática e Retórica, e o ensino de Retórica incluía o de Poética.

A partir da instalação da imprensa no Rio de Janeiro, em 1808, e do desenvolvimento dos estudos linguísticos histórico-comparativos, promoveu-se a produção de gramáticas da língua portuguesa no Brasil. No âmbito dos centros de educação, a Poética se desvinculou da Retórica em 1837, passando a ser estudada como matéria autônoma no Colégio Pedro II. Alguns anos depois, em 1871, um decreto imperial cria o cargo de “Professor de Português”.

Um século depois, na década de 1950, surgirá uma grande necessidade de recrutamento de professores para dar conta dos alunos que se multiplicavam nas escolas, devido às conquistas obtidas pelas camadas populares. Essa alta demanda desencadeou uma grande desvalorização do magistério, refletida em salários muito baixos, formação de qualidade duvidosa e condições extremamente precárias de trabalho para os professores. No que diz respeito ao componente curricular, também ocorreu modificações significativas: os manuais didáticos, que integravam tanto a gramática quanto as coletâneas literárias usadas nas aulas de Retórica, passaram também a incluir exercícios produzidos pelos próprios professores.

Nas décadas seguintes, com o advento do regime militar e a implementação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 5692, de 11 de agosto de 1971), os ensinos primário e secundário foram reformados. Por consequência, o nome da disciplina “Português” sofreu alterações, transformando-se em Comunicação e Expressão (Anos Iniciais do 1º grau), Comunicação em Língua Portuguesa (Anos Finais do 1º grau) e Língua Portuguesa e Literatura Brasileira (2º Grau). Sendo então a língua concebida como instrumento de comunicação, o ensino de gramática é minimizado e textos não literários são incluídos nos manuais didáticos.

Posteriormente, com o fim da ditadura e o início do processo de redemocratização do país, iniciado no fim da década de 1980, os estudos linguísticos recebem a influência de contribuições da Sociolinguística, da Pragmática, da Linguística Textual, da Análise do Discurso e de outras vertentes das ciências da linguagem em expansão pelo mundo. Essas contribuições serão primordiais para a configuração atual do ensino de Língua Portuguesa, por destacarem a dimensão sociointeracional e discursiva da língua, dando centralidade aos falantes, aos contextos e às ideologias que perpassam os usos linguísticos.

Caso o leitor tenha se interessado no assunto e deseje conhecer mais detalhadamente a história do componente curricular de Língua Portuguesa, recomenda-se a leitura dos textos Português na escola: história de uma disciplina curricular, da professora, pesquisadora e escritora Magda Soares (1932-2023), e A fabricação da disciplina curricular Português, do professor e pesquisador Clécio Bunzen.


Por Ronaldo Lopes de Carvalho Júnior – Licenciado em Língua Portuguesa pela UFMG – Pós-graduando em Revisão de Textos pela PUC-MG – Professor de Português e Projeto de Vida do 9º ano e de Língua Portuguesa, Literatura e Projeto de Vida da 1ª Série

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